maio 06, 2007

BARRIGA INIMIGA

Já era ícone do desmazelo físico,mas agora sabe-se quão pesado é o fardo de uma barriga gorda para o coração.O pior de tudo é que a barriga pode enganar bem o dono e o próprio médico
Está aí o mês do coração.Toda a gente sabe que o excesso de peso é péssimo para a saúde e que o mal,há muito,deixou de ser americano.Mas nem toda a gordura é igual.Para o coração,pelo menos,ter gordura nas coxas e nas nádegas não é grave.Pelo contrário,uma silhueta barriguda não augura nada de bom.
Na barriga,há que distinguir dois tipos de gordura: a superficial e a interior.A primeira acumula-se sob a pele.expande-se para fora,os médicos chamam-lhe subcutânea e não lhe dão grande importância.A outra não é tão inofensiva.É visceral,deposita-se em redor dos órgãos mais internos,cresce para fora e para dentro.
Ainda que todo o excesso de peso seja inimigo da longevidade,está a tornar-se claro que a gordura visceral é bem pior do que a subcutânea.
As razões não estão perfeitamente esclarecidas .Mas uma coisa é certa:se,ainda há dez anos,a massa gorda era vista como algo inerte,sem grande interesse médico,hoje em dia sabe-se que esse tecido mole,de cor amarela-esbranquiçada,produz numerosas substâncias,algumas das quais desencadeiam intensos processos de inflamação no sistema cardiovascular.
Justamente,as consequências desastrosas da obesidade não decorrem,apenas,do excesso de gordura no sangue a entupir as artérias.A própria massa gorda entremeada entre órgãos e músculos induz focos de inflamação nos vasos sanguíneos que fazem parar disparar o risco de trombos,AVC e enfartes do miocárdio.
Como se não bastasse,este efeito inflamatório da massa gorda diminui a sensibilidade do organismo à insulina,favorecendo o aparecimento da diabetes.E quanto mais visceral é a gordura,mais sinais inflamatórios esta liberta.Por isso é que,em anos recentes,os activistas da prevenção cardiovascular passaram a chamar a atenção dos médicos para o tamanho da bariga dos doentes enquanto factor de risco.Mas,mesmo o perímeto abdominal pode ser um indicador pouco fiável,na medida em que leva tudo em conta,não faz destrinça entre gordura visceral e subcutânea,alerta Jean Pierre Després,o médico canadiano que está a agitar as águas da intervenção médica nesta matéria.
Para quem tem dúvidas,o especialista dá um exemplo:"Imaginem dois indivíduos de meia idade com o mesmo peso,altura e perímetro abdominal.Quando peço uma ressonancia magnética abdominal aos dois,vejo que um tem 155 cm2 de gordura visceral enquanto o outro tem 96 cm2.É uma diferença assustadora e,até a constactar,não podia ver que num deles o risco cardiovascular´é muito superior ao do outro,apesar de ambos terem uma constituição física idêntica."
E se pensarmos que, entre nós,casos destes são esporádicos,Pedro von Hafe,médico e investigador da Faculdade do Porto,demonstra o contrário:"Nos últimos anos estudámos uma amostra representativa da população residente no Porto com idade igual ou superior a 40 anos e,dos 300 indivíduos a quem fizemos Tacs abdominais,50,3 % tinham excesso de gordura visceral".
Porém,nem mesmo nos países ricos os médicos podem dar-se ao luxo de pedir TAC s e ressonancias magnéticas "a torto e a direito"para medir a gordura abdominal oculta nos seus pacientes.Seria incomportável.
Para contornar este obstáculo,a equipa de Després está a demonstrar que é possível inferir a quantidade de gordura visceral se olharmos não só para o perímetro abdominal mas,também,para uma vulgar análise de sangue,os triglicéridos.Não é só pelo colesterol,pela hipertensão e pelo tabaco que se avalia o risco cardiovascular.Há outros factores com um papel muito importante na origem destas doenças,como os triglicéridos,embora os médicos nunca lhes tenham prestado grande atenção.Agora sabemos que,nos "barrigudos",os triglicéridos são um bom indicador da gordura mais perigosa que alguém pode ter.É uma análise de rotina muito simples.Esperemos que os médicos passem a interpretá-la correctamente,afirmou Després .
Então,o que há a fazer se os níveis de triglicéridos desmascararem um excesso de gordura oculta?A ciência diz-nos que não há como atacar directamente o problema,ou seja,perder peso.Até porque a gordura visceral é a primeira a ser descartada quando o organismo entra em restrição alimentar.
CONSUMIDORES ENTRE TITÃS

No mundo em que vivemos,perder peso tornou-se uma obsessão das mais difíceis de satisfazer.Os nutricionistas dizem que para a maioria da pessoas é muito dificil,se não mesmo impossivel,manter a motivação e a força de vontade necesárias para cumprir uma dieta magra até ao fim da vida.Tanto mais,quando,de ano para ano,a indústria alimentar reinventa tudo o que não devemos comer,acentuando-lhe o sabor,o aroma e o "marketing".

Pelo mundo fora,as barrigas continuam a crescer.E, em proposta à calamidade do consumo hipercalórico,a indústria farmacêutica decidiu investir em moléculas que ajudam a perder o peso.Mas quem anseia por uma pilula mágica bem pode adiar a esperança.Tal solução não se avista.

A grande expectativa para os próximos anos é o rimonabant,o primeiro medicamento a actuar no sistema endocanabinóide,um importante "regulador cerebral" do impulso de comer.

Trata-se de um supressor do apetite e indutor do consumo energético que deverá chegar às farmácias em 2008.Aprovado pela Agência Europeia do Medicamento,o fármaco induz perdas de massa gorda que rondam os 10% do peso corporal em tratamentos com a duração de um ano.Ou seja,não parece que se destina aos verdadeiramente obesos,nem aos que queiram aparecer na praia como uma figura esguia.

Segundo s Sanofi-Aventis,o gigante farmaceutico responsável pelo rimonabant,este tem dois objectivos:evitar a progressão do excesso de peso para a obesidade e travar o avança da diabetes e da doença cardiovascular na população quer estiver a tempo de o fazer.

O apelo à correcção dos hábitos alimentares e do estilo de vida não parece resultar quanto baste para evitar a pandemia da diabetes e da mortalidade cardiovascular precoce.Assistimos ao prelúdio de uma nova era.Para adiar a doença,passaremos a tomar medicamentos que minoram os estragos de uma vida desregrada.

Fonte:Jornal Expresso







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